domingo, 31 de agosto de 2008

O urso não deve ser provocado

A edição de hoje de "O Globo" ,domingo, publica um artigo meu sobre os perigos de atiçar o urso.Transcrevo o texto:

A Rússia ,que é o estado de maior extensão territorial do planeta , possui imensas reservas de petróleo e gás natural ,tem uma população de 142 milhões de habitantes, o 11º. PIB com 1.3 trilhão de dólares e o maior arsenal mundial de armas nucleares. É óbvio que não se pode considerá-la como um país declinante ou débil ,até por que sua economia cresce há alguns anos a taxas próximas de 8% ao ano.
Ora, foi precisamente o que fez o governo Bush ao estimular o presidente Mikheil Saakashvili a cometer a insensatez de atacar militarmente a Ossetia e a Abkazia ,onde a população é majoritariamente russa e não deseja fazer parte da Georgia.Por que digo isso?
Desde o desastre do aprendiz de feiticeiro Gorbatchov –que teve a ilusão de renovar o comunismo quando ele já estava absolutamente falido – que os Estados Unidos procuram levar a Russia a adotar os paradigmas ocidentais na política e na economia.Não o têm feito com compreensão respeitosa e paciência, mas com pressões e imposições ofendidas ante as resistências russas.Na euforia da vitória sobre a União Soviética , o presidente George Herbert Bush proclamou em 1991 o início de uma nova era de segurança e estabilidade internacionais sob a égide dos Estados Unidos.Nessa concepção, a Rússia desempenharia de início um papel semelhante ao Japão e a Alemanha no pós-guerra: países derrotados pelas armas que ficariam sob a tutela americana até serem gradualmente inseridos no veio central do Ocidente.
Assim fazendo, Washington perdeu a oportunidade histórica de estabelecer com a Rússia uma robusta cooperação estratégica.Como disse Henry Kissinger em recente artigo “ sucessivos governos americanos agiram como se a criação da democracia russa fosse um tarefa principalmente americana...Por isso, uma grande maioria dos russos considera os Estados Unidos presunçosos e determinados a minar a recuperação da Rússia”.
Ora , a Rússia precisa do Ocidente para obter mercados, investimentos, tecnologias e referências.Se algum ensinamento lhe ficou do naufrágio soviético foi de que o isolamento tem como preço o empobrecimento e o atraso.Mesmo que Putin e agora Medvedev estejam valendo-se do apoio popular maciço que desperta uma reação forte contra provocações externas, não creio que eles ignorem a verdade clara de que a Rússia não ganhará em fechar-se no seu perímetro. O Kremlin sabe que não pode recriar a Cortina de Ferro.Nesse sentido , incorporação da Hungria, da República Tcheca,da Polônia, da Romênia , da Bulgária e das três repúblicas bálticas à União Européia foi um desenvolvimento muito positivo para estes países mas a Rússia não considerou que houvesse nisso qualquer desafio ou ameaça.

Embora a secretária de Estado Condolezza Rice seja PHD em história e especialista em Rússia , o governo Bush vem tendo uma atuação temerária na questão da Georgia.Estimulou o presidente Saakashvili a subir o tom de confrontação com Moscou, prometeu-lhe garantias que não podia honrar e ,na hora do fiasco, limitou-se a mandar aviões com doações humanitárias.É óbvio que estando envolvidas em duas frentes difíceis no Afganistão e no Iraque, as forças militares americanas não poderiam atuar contra os russos no Cáucaso.É também patente que um governo enfraquecido e terminal não poderia arriscar a eclosão de um enfrentamento com a Rússia em terreno tão desfavorável.Creio que este é mais uma iniciativa , de muitas , que os ultra-conservadores da Casa Branca articularam e que tanto têm contribuído para debilitar o poder e, sobretudo, a credibilidade americana.
Não há de ser com os procedimentos que conduziram a Georgia ao recente desaire que os Estados Unidos vão estabelecer a democracia ou a independência dos países da esfera de influência russa.O motivo principal de Putin e Medvedev é preservar intacta a influência russa, é mostrar quem é a grande potência na região.Por isso, quanto mais a Rússia for provocada mais reagirá com força ,como é sua tradição há três séculos.

Um comentário:

Anônimo disse...

O urso cheirou mel.A atitude americana é temerária na região e como dito no ''economist''o que o Presidente da Georgia ,advogado de Nova Iorque, fez foi"'foolish, if not criminal"'.A partir de agora se constatou que o mundo não é mais unipolar,como querem os americanos.